quinta-feira, 2 de junho de 2011

O IRS (quase) explicado

Para chegar à última medida proposta neste post, há que perceber bem como são calculados os impostos sobre os rendimentos, Neste e no próximo post tentarei tratar disso.

O Imposto Sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares (IRS) é regido por um Código que determina a forma como o Estado nos taxa, em função do tipo e volume de rendimentos que auferimos no seio de um agregado. Este código pode ser obtido aqui. São mais de 120 páginas difíceis de roer para alguém que, como eu, seja pouco dado a arbitrariedades e números mágicos que aparecem não se sabe bem porquê.


O gráfico acima representa os vários escalões de taxas (a verde) do IRS, assim como a taxa efectivamente aplicada (a roxo), em função do Rendimento Colectável de uma pessoa num agregado. É importante notar que quando alguém diz que é taxado a 46.5%, a taxa máxima, na realidade o imposto efectivamente aplicado pode ser substancialmente mais baixo. É um erro muito comum...

Como exemplo, alguém num agregado que tenha cerca de 180000€ de rendimento colectável, está no escalão com taxa máxima, mas não chega a pagar 40% de IRS. Isto acontece porque a taxação é progressiva, isto é, os rendimentos são taxados aplicando cada uma das taxas dos vários escalões apenas aos rendimentos que 'cabem' nesse escalão.

Alguém com um rendimento colectável de 18375€ (limite inferior do 4º escalão) é taxado em 11.5% sobre 4898€, 14% sobre 2512€, e 24.5% sobre 10965€, o que dá uma média de 19.599% sobre o total, tal como pode ser observado no gráfico acima ou na tabela abaixo.

Escalões (€) Taxa (%) Taxa média (%)
até 4898 11,5 11,500
de 4898 até 7410 14 12,348
de 7410 até 18375 24,5 19,599
de 18375 até 42259 35,5 28,586
de 42259 até 61244 38 31,504
de 61244 até 66045 41,5 32,231
de 66045 até 153300 43,5 38,645
mais de 153300 46,5 38,645
para 200000 46,5 40,479

Mas o que é isto do Rendimento Colectável? Bem, o Rendimento Colectável, aquele que é tido em conta para apuramento do imposto a aplicar, é obtido somando o Rendimento Líquido de várias categorias de rendimentos e subtraindo depois Perdas e Abatimentos, caso existam. Confuso? Talvez não, mas ainda falta saber o que é o Rendimento Líquido de cada categoria de rendimentos...

Basicamente, são consideradas 9 categorias de rendimentos. Qualquer pessoa pertencente a um agregado pode ter rendimentos em qualquer uma destas 9 categorias. A justificação da existência destas categorias é que a obtenção dos rendimentos é diferenciada em termos de origem e esforço, o que tem alguma lógica, mas não deixa de ser uma complicação, com carradas de excepções, deduções e abatimentos. Cada categoria tem regras próprias para, a partir do Rendimento Bruto da categoria, se chegar ao tal Rendimento Líquido para a mesma categoria. À soma de todos os rendimentos líquidos de cada uma das categorias dá-se também o nome de Rendimento Global Líquido.

Ou seja, cada agregado tem Rendimentos Brutos que se distribuem por várias Categorias de rendimentos, em função da sua origem. Ao Rendimento Bruto de cada categoria são subtraídas várias Deduções Específicas afectas à categoria, assim como são considerados outros factores, cujo objectivo é corrigir os esforços de obtenção dos rendimentos das várias categorias. Com isto obtemos o Rendimento Líquido de cada uma das categorias. Somamos estes rendimentos e obtemos o Rendimento Global Líquido. Depois só temos de subtrair Perdas e Abatimentos, caso existam, e chegamos ao Rendimento Colectável.

Note-se que isto é feito para um agregado como um todo, juntando os rendimentos de uma mesma categoria, caso exista mais do que uma pessoa com rendimentos desse tipo. Um exemplo disto tudo pode ser encontrado aqui.

Mas não ficamos por aqui...
Depois de termos o Rendimento Colectável, podemos então determinar a taxa a aplicar. Se o agregado for constituído por um solteiro, isso faz-se de forma directa, determinado o escalão onde se insere o Rendimento Colectável. Se o agregado for constituído por um casal, antes de se determinar o escalão, divide-se o Rendimento Colectável por 2. Isto faz sentido e traz benefícios, nomeadamente quando a diferença entre os rendimentos dos dois membros do casal é considerável.

Depois de determinada a taxa calcula-se então o valor correspondente ao imposto a pagar, a chamada Colecta. Como a taxa diz apenas respeito ao escalão onde se inserem os rendimentos e os escalões baixo deste têm taxas mais baixas, abate-se uma parcela que está estipulada por escalão. Esta operação 'misteriosa' nada mais é que a correcção que permite passar da taxa do escalão à taxa média e é por isto que os escalões são progressivos. No caso de um solteiro, a valor da Colecta fica assim determinada... por agora! No caso de um casal, o passo seguinte é multiplicar o valor obtido por 2.

Mas ainda não ficamos por aqui...
Para chegarmos ao valor final de imposto a pagar (ou receber) temos ainda de aplicar as Deduções à Colecta. À Colecta subtraímos então despesas de saúde, educação e habitação, prémios de seguros, PPR's, etc. Muitas destas deduções têm limites em função do escalão onde se inserem os rendimentos ou são deduzíveis apenas numa percentagem. Depois de deduzidos estes valores ficamos então com o que se chama Imposto Liquidado. Isto não corresponde ainda ao valor a pagar, porque ao longo do ano, no trabalho por conta de outrém, fazemos aquilo que se chama Retenção na Fonte, em que automaticamente o Estado fica provisoriamente com um valor daquilo que recebemos. É uma maneira fácil de o Estado se financiar... sem pagar juros!

Mas porque o Estado já tem essas Retenções do lado dele, há que ajustar contas, literalmente! Do Imposto Liquidado, subtraímos então tudo o que o agregado não recebeu por ter sido retido na fonte em favor do Estado. E é assim que chegamos ao valor final que pode ser positivo ou negativo. Caso seja negativo, quer dizer que o Estado ficou com dinheiro que pertencia ao agregado e terá de o devolver. Caso contrário, o agregado tem de pagar ao Estado.

Um dia, quando tiver tempo, tenho é de fazer um boneco de todo este esquema. Sempre será mais fácil de explicar...

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