terça-feira, 28 de junho de 2011

10. Reestruturar e racionalizar o IRS e os seus escalões de rendimento em função da PdC

No seguimento das primeiras 10 medidas propostas neste post, defendo aqui a número 10.  À laia de Futre, além das 10 enunciadas, há mais uma ou outra que irei também propor em breve...

Esta é um pouco mais difícil de explicar, mas parte basicamente da análise às taxas correntes praticadas no IRS. Abaixo podem ver um gráfico onde se pode ter uma ideia muito clara dos escalões de IRS em função do Rendimento Colectável. A par dos escalões é também mostrado a taxa média efectiva a pagar. O Rendimento Colectável, tal como explicado neste post, pode ser, e é geralmente, consideravelmente diferente do Rendimento Bruto (é mais baixo por efeito das deduções específicas, perdas e abatimentos). Note-se também que na declaração de IRS não são tidos em conta rendimentos provenientes de mais valias bolsistas e juros de depósitos a prazo, já que estes são taxados na fonte a 20% e 21.5%, respectivamente, libertando-os de outros impostos. Considero isto injusto e faz parte desta proposta passar a tratar estes rendimentos como os outros, provavelmente numa nova categoria.
A linha mais grossa em escada representa os escalões actuais, enquanto que a mais fina representa o imposto efectivamente/globalmente cobrado. É esta última que realmente interessa. Na 'legenda' são apresentados (mal e porcamente eu sei) os limites dos escalões em €, assim como as respectivas taxas. Para os menos atentos, no eixo das abcissas (Rendimento Colectável) 0.2 deve ser lido como 20000€ e 1 como 100000€.
Como facilmente pode ser observado neste gráfico, os primeiros escalões têm uma progressão relativamente acentuada na sua taxa, enquanto que nos últimos esta progressão é relativamente tímida. Existem 8 escalões de rendimentos e a abrangêngia de cada um deles varia substancialmente, não se notando qualquer regularidade: uns escalões abrangem rendimentos na ordem das várias dezenas de milhares de euros enquanto outros, nomeadamente o 6º escalão, se ficam por uns curtos milhares. 

Algumas perguntas se impõem. Como são determinadas estas taxas? Que lógica subjaz à decisão de aumentar uma taxa ou criar um novo escalão? Será que todas estas decisões são desinteressadas para quem as toma? Como pode o cidadão comum perceber melhor as implicações das mexidas nestas taxas e escalões? E por último, como podemos criar um modelo para estas taxas que limite de forma racional, ou o mais racional possível, futuras alterações? Provavelmente existe uma razão prática para o formato actual, mas como não consegui encontrar nenhuma justificação para estas taxas e escalões, fiquei com a sensação que tudo é decidido de forma bastante 'porque sim'.

O que defendo neste post é a existência de um modelo, também progressivo como o actual, que nos permita racionalizar e até prever melhor as consequências de alterações aos parâmetros do mesmo. O modelo que proponho depende de vários parâmetros:
  • Valor da PdC, que deve ser calculado todos os anos em função de um cabaz de produtos essencias à sobrevivência;
  • Número de escalões, que considero ser exagerado no modelo actual e que limita as progressões das taxas, nomeadamente nos escalões mais altos como tentarei demonstrar no próximo post;
  • Número de PdC's no primeiro escalão (escalão de referência), que deve estar de alguma forma afecto ao rendimento médio de todos os cidadãos;
  • Taxa do primeiro escalão (Taxa mínima);
  • Taxa do último escalão (Taxa máxima), que em conjunto com a anterior definem a progressão de taxas entre escalões de forma uniforme, ou seja, o acréscimo percentual para cada escalão é igual;
  • Coeficiente de expansão dos escalões, que define os limites dos escalões de forma recorrente, ou seja calcula-se o limite de um dado escalão aplicando este coeficiente ao limite do escalão imediatamente anterior;
  • Imposto máximo a aplicar, que, independentemente da taxa do último escalão que apenas determina a progressão, serve para limitar uma taxação excessiva.
Parece complicado, mas é só aparência... Vamos por partes.

Suponhamos que o valor da PdC para o ano de 2012 é calculado em 380€. Se admitirmos que o valor de referência para o 1º escalão pudesse ser de 35 PdC's, então o limite deste escalão seria de 35 x 380 = 13300€. Os limites dos escalões seguintes seriam calculados tendo em conta o coeficiente de expansão. Se este fosse 3, então o limite superior do 2º escalão seria 3 x 13300 = 39900€, o do 3º seria 3 x 39900 = 119700€, etc. Sabendo o número de escalões, os limites ficam plenamente determinados.

Considero que o número de escalões actual é exagerado e parece-me que este visa apenas limitar o crescimento das taxas efectivas nos escalões superiores. Proponho substancialmente menos: 3. Em alguns países nórdicos chegam a ser apenas 2. Tendo isto em conta, o 1º escalão taxaria rendimentos dos 0 aos 13300€, o 2º taxaria dos 13300 aos 39900€, e o 3º taxaria rendimentos superiores a 39900€.

Para o modelo ficar quase completamente determinado, teremos de tratar das taxas a aplicar em cada escalão. Se tivermos em conta que além da PdC, cada cidadão teria ainda acesso gratuito a saúde e educação, não seria escandaloso considerar uma taxa mínima, ou do primeiro escalão, igual a 20%. Note-se também que, não havendo lugar a deduções devidas a despesas de saúde e educação, o rendimento colectável seria já por si mais elevado, o que contribuiria para uma maior colecta. A taxa máxima, ou do 3º escalão neste caso, suponhamos que se situa nos 50%. Esta taxa pode parecer um exagero, mas há ainda o limite máximo de imposto a aplicar que nada impede que seja inferior a esta. No gráfico apresentado mais abaixo ficará mais claro. O 2º escalão, assim como todos os escalões intermédios se mais houvesse, teria automaticamente a sua taxa determinada, já que o modelo proposto impõe uma progressão percentual igual para todos os escalões (todos os degraus têm a mesma altura). No nosso caso, o 2º escalão seria taxado em 35%.

Por fim, há que impor um limite máximo para a taxação efectiva. Suponhamos que definimos que ninguém deve ser taxado em mais de 45%.

No gráfico abaixo podemos visulizar este modelo e compará-lo com o actual.
A vermelho é apresentado o modelo proposto. A azul é apresentado o modelo actual. Mais do que os escalões, o que interessa são as linhas mais finas que representam o imposto efectivamente/globalmente cobrado. O que salta à vista é que proponho um agravamento dos impostos sobre as pessoas singulares. A linha horizontal a tracejado representa o limite máximo de imposto a cobrar e que basicamente nos diz que, no caso apresentado, agregados com rendimentos colectáveis acima de 159600€ não serão taxados na globalidade acima dos 45%, apesar da taxa do último escalão ser de 50%.

O interessante neste modelo é que limita ou dificulta as alterações cirúrgicas que se podem fazer no actual modelo, além de que é intrincadamente dependente de vários itens, levando a ponderações mais lógicas, a meu ver, nas alterações dos parâmetros. Por exemplo, o valor da PdC cresceria todos os anos embalada apenas pelo valor da inflação, já que as necessidades básicas que pretende garantir não se alterariam substancialmente de ano para ano. Este crescimento reflectir-se-ia imediatamente nos limites dos escalões.

A este modelo juntaria ainda mais uma restrição: todos os anos, o governo só poderia alterar no máximo 2-3 dos parâmetros, e sempre dentro de limites bem estabelecidos para cada um deles. Alterações drásticas, como aumentar ou diminuir o número de escalões, teriam de passar obrigatoriamente pela Assembleia da República.

No próximo post tentarei explorar um pouco a forma do modelo proposto para algumas variações dos seus parâmetros.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Multas e citrinos


No outro dia envolvi-me numa discussão sobre multas com vários amigos meus. Para salvaguardar o bom nome dos intervenientes vou tratá-los de forma anónima.

O Limão e a minha grande amiga Lima insurgiram-se contra a minha proposta de indexar algumas multas aos rendimentos dos prevaricadores. Outros citrinos presentes, talvez face ao número de garrafas de tinto vazias acumuladas nas imediações, tomaram posições menos extremadas. O principal argumento da dupla Lima-Limão é que se queremos tratar todos de forma igual, não podemos multar uns a 30€ e outros a 300€. Este é também o meu argumento, mas talvez porque entendo a igualdade de forma diferente, resulta precisamente ao contrário.

Para começar, entendo que se temos de prender alguém, isso deve ser igual para todos. Obviamente que não defendo que, para o mesmo crime, deva haver penas efectivas diferentes. Sejam ricos ou pobres, ficam privados da liberdade.

No caso das multas de trânsito por manobras perigosas, excesso de velocidade ou excesso de alcool, por exemplo mas não só, acho que deve haver discriminação em função dos rendimentos. O objectivo destas multas é proteger os outros da inconsciência dos prevaricadores. Ao contrário de outras infracções que têm consequências menores, o objectivo último das multas nestes casos é não chegarmos sequer às consequências. Alguém que tenha poder financeiro suficiente pode sempre arriscar confortavelmente, pois isso terá, para o próprio, um custo marginal.

Mesmo havendo outras penalizações que complementam as multas, na realidade, 100€ de multa dói de forma diferente se o prevaricador for a Laranja de parcos rendimentos que apareceu mais tarde no nosso jantar sobejamente regado, ou se for o Maracujá anfitrião, que tem, digamos, uma vida bastante desafogada (e ainda bem!).

Não digo que não haja um patamar mínimo para a multa, mas, a menos que queiram convencer-me que é legítimo comprar-se o que quer que seja, mantenho que a igualdade também passa por haver diferenças no tratamento.

Na Suiça acontece desta forma: aqui e aqui.